PRONUNCIAMENTO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO – AUSÊNCIA DE DEBATE E DECISÃO PRÉVIOS SOB O ÂNGULO CONSTITUCIONAL – REPERCUSSÃO GERAL – INADEQUAÇÃO.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO – JULGAMENTO DE FUNDO NO PLENÁRIO VIRTUAL – IMPROPRIEDADE.
1. A Assessoria prestou as seguintes informações:
Eis a síntese do que discutido no Recurso Extraordinário com Agravo nº 637.975/MG, da relatoria do Ministro Cezar Peluso, Presidente do Supremo, inserido no sistema eletrônico da repercussão geral às 23 horas e 59 minutos do dia 20 de maio de 2011.
O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, no julgamento do Agravo nº 1.0878.07.015749-9/002, negou seguimento a recurso interposto pelo Estado de Minas Gerais contra decisão proferida em execução fiscal de valor inferior a 50 ORTN. Consignou não implicar o artigo 34 da Lei nº 6.830/80 ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, do acesso à jurisdição e do duplo grau de jurisdição. Assentou que somente seriam cabíveis embargos de declaração ou embargos infringentes nos casos de sentenças proferidas em embargos à execução fiscal de valor igual ou inferior a 50 ORTN na data da distribuição da ação.
Não foram interpostos embargos declaratórios.
No extraordinário protocolado com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, o Estado de Minas Gerais argui ofensa ao artigo 5º, incisos XXXV e LIV, da Carta da República. Sustenta, inicialmente, que o artigo 34 da Lei nº 6.830/80 não teria sido recepcionado pela Lei Maior, pois, ao prever apenas duas espécies de recurso, afrontaria diretamente o princípio do amplo acesso ao Judiciário. Consoante salienta, o princípio do duplo grau de jurisdição deve prevalecer sobre a Lei nº 6.830/80, por tratar-se de norma editada em 1980, anteriormente à atual Constituição Federal.
Sob o ângulo da repercussão geral, diz estar em jogo tema a ultrapassar os limites subjetivos da causa. A matéria seria relevante do ponto de vista social e econômico, por alcançar todos os cidadãos submetidos a execuções fiscais de pequeno valor de forma imprópria, sem possuírem meios para o reexame da questão por órgão colegiado.
Não houve apresentação de contrarrazões.
O extraordinário não foi admitido na origem.
O Estado de Minas Gerais, no agravo de recurso extraordinário, afirmou que a decisão recorrida, ao contrário do entendimento revelado no ato agravado, implicou violência frontal e direta a preceito constitucional, motivo pelo qual o recurso extraordinário deveria ter sido admitido e provido.
O agravado não protocolou contraminuta.
Eis o pronunciamento do relator, Ministro Cezar Peluso, Presidente do Supremo:
1. Trata-se de agravo contra decisão que indeferiu o processamento de recurso extraordinário, interposto de acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, assim ementado:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGA SEGUIMENTO A RECURSO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. VALOR INFERIOR AO DE ALÇADA. 50 ORTN. I Contra a sentença proferida em embargos à execução fiscal, cujo valor, à época da distribuição, era inferior a 50 ORTN, segundo a tabela disponibilizada pelo egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, são admissíveis apenas embargos de declaração e embargos infringentes. II É de se negar seguimento a recurso de Apelação manifestamente inadmissível, como aquele interposto contra decisão proferida em execução fiscal de valor inferior a 50 ORTN.
Aduz que:
[...] Cuida-se de recurso interposto contra decisão do egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais que, em sede de agravo regimetal (art. 557, §1º do CPC), confirmou a decisão do relator e do juízo de primeiro grau, inadmitindo recurso de apelação interposto contra sentença em embargos a execução fiscal de valor inferior a 50 ORTN.
Entendeu-se por bem aplicar uma legalidade estrita, ainda que em detrimento dos princípios consagrados na Constituição Federal devido processo legal, contraditório e ampla defesa, bem como o amplo acesso ao Judiciário, explícitos, e o duplo grau de jurisdição, implícito [...] (fl. 98).
Apresenta preliminar formal e fundamentada de repercussão geral, na forma do art. 543-A, § 2º, do CPC (fl.91-93).
2. Admissível o agravo.
Presentes os requisitos formais de admissibilidade, dou provimento ao agravo, convertendo-o em recurso extraordinário.
3. A questão suscitada neste recurso versa sobre a compatibilidade do art. 34 da Lei n. 6.830/80 que afirma incabível a apelação em casos de execução fiscal cujo valor seja inferior a 50 ORTN com os princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, do acesso à jurisdição e do duplo grau de jurisdição.
Esta Corte possui jurisprudência firmada no sentido de que o art. 34 da Lei n. 6.830/80 está de acordo com o disposto no art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal de 1988 como se vê dos AgR-RE n. 460.162, Primeira Turma, Min. Rel. MARCO AURÉLIO, DJ de 13.3.2009, AgR-AI n. 710.921, Segunda Turma, Min. Rel. EROS GRAU, DJ de 27.6.2008 e RE 140.301, Primeira Turma, Min. Rel. OCTÁVIO GALLOTTI, DJ de 28.2.1997, assim ementados:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO ARTIGO 108, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DESPROVIMENTO DO AGRAVO. Consoante a jurisprudência do Supremo, o inciso II do artigo 108 da Lei Fundamental não é norma instituidora de recurso. O dispositivo apenas define a competência para o julgamento daqueles criados pela lei processual. Nada impede a opção legislativa pela inviabilidade de inconformismo dirigido à segunda instância (AgR-RE n. 460.162, Primeira Turma, Min. Rel. Marco Aurélio, DJ de 13.3.2009).
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI 6.830/80. SUPERVENIÊNCIA DO ARTIGO 108, II, DA CB/88. REVOGAÇÃO TÁCITA. NÃO OCORRÊNCIA. PRECEDENTE. 1. Este Supremo Tribunal Federal já decidiu que o artigo 108, inciso II, da Constituição do Brasil, não revogou tacitamente o disposto do artigo 34 da Lei 6.830/80. Agravo regimental a que se nega provimento (AgR-AI n. 710.921, Segunda Turma, Min. Rel. Eros Grau, DJ de 27.6.2008).
EMENTA: - Apelação de que não se conheceu, por ser o valor da causa inferior ao fixado pela Lei nº 6.825-80. Contrariedade, não configurada, do art. 108, II, da Constituição, que não é norma instituidora de recurso, mas de competência para o julgamento dos criados pela lei processual (RE 140.301, Primeira Turma, Min. Rel. Octávio Gallotti, DJ de 28.2.1997).
4. Assim sendo, reafirmo a jurisprudência da Corte para negar provimento ao recurso extraordinário.
Brasília, 16 de maio de 2011.
Ministro Cezar Peluso
Presidente
Documento assinado digitalmente
Destaco constar da presente repercussão geral questão relativa à reafirmação da jurisprudência do Supremo.
2. A leitura do acórdão proferido pelo Tribunal de origem escancara a ausência de prequestionamento do tema constitucional. Daí o extraordinário ter sido trancado. O agravo merecia o desprovimento, mas foi provido para, a seguir, preconizar-se o julgamento de fundo do recurso extraordinário no Plenário Virtual.
O passo já se mostrou largo no que o aludido Plenário foi criado regimentalmente para definir-se a configuração, ou não, da repercussão geral. À época, fiquei vencido. Agora, parte-se para o exame do mérito do extraordinário no mencionado sistema. O prejuízo dos jurisdicionados é manifesto, contrariando-se o princípio do juiz natural em sua abrangência maior.
De qualquer sorte, na origem, não houve adoção de entendimento sob o ângulo constitucional. A repercussão geral refere-se a recurso extraordinário em que se veicula controvérsia de tal índole. Confiram com o disposto no artigo 102, § 3º, da Carta Federal:
Art. 102. [...]
[...]
§ 3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.
3. Pronuncio-me pela inadequação do instituto da repercussão geral.
4. À Assessoria, para acompanhar o incidente.
5. Publiquem.
Brasília – residência –, 5 de junho de 2011.
Ministro MARCO AURÉLIO
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